Falaram-me um dia que o Estado era laico, e aprendi por um motivo imperativo: desempregado, à época, estudava para passar em um concurso público e, assim, adquirir uma certa estabilidade financeira na vida.
O sujeito que me falou isso não é indeterminado, como coloquei no primeiro período deste texto. O saudoso Professor Frederico Mello (Fred, para os mais chegados) explicou-me direitinho nas aulas de direito constitucional que tive com ele. Pena que já não está conosco, porém suas lições ficaram para posteridade. Aprendi, depois de grande (como dizem os mais experientes), que o Estado não tem religião.
O legislador quis com isso proclamar a liberdade de crença, quis evitar que o nosso Estado se tornasse uma república baseada em princípios fundamentalistas, como acontece com vários países do oriente médio e nas Irlandas também; quis respeitar toda fé professada (seja ela qual for) e também afastar a religião das coisas públicas. Fez bem!
Acontece que há muito tempo a Constituição não tem sido alvo de respeito. Dizer hoje que o nosso Estado não tem religião é falácia. Basta ver nas escolas públicas: as aulas de ensino religioso transformam-se em aulas de uma só crença, que aqui não preciso citar. Ao fazer isso, direciona-se o aluno a apenas uma religião, desrespeita-se a lei de diretrizes e bases, a Constituição e, sobretudo, o próprio aluno. Tira direito que ele tem de conhecer as diversidades culturais religiosas do Brasil, de expandir sua capacidade de pensar outras religiões, de respeitar outras crenças e, mais que isso, conviver com a alteridade.
Contudo, a marca da religião não está só no ensino, basta ir a algum órgão público que serão encontradas imagens pregadas nas paredes. É assim na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, nos Tribunais país a fora. Essas imagens, segundo a decisão da Juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível de São Paulo, não ferem os princípios da laicidade e da isonomia do Estado. Conforme disse a própria magistrada, “a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos”.
Concordo, deve haver tolerância sim. Mas como haverá a plena tolerância se nem todas as religiões admitem imagens? Há vários cidadãos ateus, esses não merecem respeito também? Ou todas ou nenhuma. Outra questão: será que a Excelentíssima Sra. Juíza toleraria uma imagem de um santo de uma religião afro-brasileira em seu gabinete? E se houvesse uma imagem de Maomé, ela penduraria ao lado do seu crucifixo? E Buda, e Shiva, e Jah e Vishnu...?
Haveria, sim, tolerância religiosa se nos departamentos públicos estivessem todas imagens sagradas do mundo, ou se num concurso público para Capelão, por exemplo, admitissem outras autoridades religiosas além de padres católicos e pastores protestantes. Dessa forma, a pergunta que não quer calar é: será mesmo que a Juíza respeitou mesmo um outro princípio constitucional, o da imparcialidade?
O Estado se torna laico, então, só para algumas religiões, porque “todas são iguais, mas umas são mais iguais que as outras”.
O sujeito que me falou isso não é indeterminado, como coloquei no primeiro período deste texto. O saudoso Professor Frederico Mello (Fred, para os mais chegados) explicou-me direitinho nas aulas de direito constitucional que tive com ele. Pena que já não está conosco, porém suas lições ficaram para posteridade. Aprendi, depois de grande (como dizem os mais experientes), que o Estado não tem religião.
O legislador quis com isso proclamar a liberdade de crença, quis evitar que o nosso Estado se tornasse uma república baseada em princípios fundamentalistas, como acontece com vários países do oriente médio e nas Irlandas também; quis respeitar toda fé professada (seja ela qual for) e também afastar a religião das coisas públicas. Fez bem!
Acontece que há muito tempo a Constituição não tem sido alvo de respeito. Dizer hoje que o nosso Estado não tem religião é falácia. Basta ver nas escolas públicas: as aulas de ensino religioso transformam-se em aulas de uma só crença, que aqui não preciso citar. Ao fazer isso, direciona-se o aluno a apenas uma religião, desrespeita-se a lei de diretrizes e bases, a Constituição e, sobretudo, o próprio aluno. Tira direito que ele tem de conhecer as diversidades culturais religiosas do Brasil, de expandir sua capacidade de pensar outras religiões, de respeitar outras crenças e, mais que isso, conviver com a alteridade.
Contudo, a marca da religião não está só no ensino, basta ir a algum órgão público que serão encontradas imagens pregadas nas paredes. É assim na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, nos Tribunais país a fora. Essas imagens, segundo a decisão da Juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível de São Paulo, não ferem os princípios da laicidade e da isonomia do Estado. Conforme disse a própria magistrada, “a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos”.
Concordo, deve haver tolerância sim. Mas como haverá a plena tolerância se nem todas as religiões admitem imagens? Há vários cidadãos ateus, esses não merecem respeito também? Ou todas ou nenhuma. Outra questão: será que a Excelentíssima Sra. Juíza toleraria uma imagem de um santo de uma religião afro-brasileira em seu gabinete? E se houvesse uma imagem de Maomé, ela penduraria ao lado do seu crucifixo? E Buda, e Shiva, e Jah e Vishnu...?
Haveria, sim, tolerância religiosa se nos departamentos públicos estivessem todas imagens sagradas do mundo, ou se num concurso público para Capelão, por exemplo, admitissem outras autoridades religiosas além de padres católicos e pastores protestantes. Dessa forma, a pergunta que não quer calar é: será mesmo que a Juíza respeitou mesmo um outro princípio constitucional, o da imparcialidade?
O Estado se torna laico, então, só para algumas religiões, porque “todas são iguais, mas umas são mais iguais que as outras”.