Quem disse que religião, política e fubebol não se discutem?

No popular, houve-se muito que "religião, política e futebol" não se discute (sic). Na verdade, o dizer não incluía o termo "política", ele só foi incorporado mais tarde, pela elite e pelos próprios políticos, a fim de evitar o debate e os questionamentos político entre as pessoas. Dessa forma, sem o debate, como poderia eu estabelecer meu posicionamento e também aprender com o próximo? Debates ajudam a esclarecer, ajudam no ceticismo, no questionamento. Além do mais, não só a política, mas também a religião e o futebol são passíveis de debates, desde que ambas as pessoas estejam dispostas a não somente falar, mas, antes de mais nada, escutar e aprender. Debatamos, então, sim.







21 de ago. de 2009

O Estado é laico para quais religiões?

Falaram-me um dia que o Estado era laico, e aprendi por um motivo imperativo: desempregado, à época, estudava para passar em um concurso público e, assim, adquirir uma certa estabilidade financeira na vida.

O sujeito que me falou isso não é indeterminado, como coloquei no primeiro período deste texto. O saudoso Professor Frederico Mello (Fred, para os mais chegados) explicou-me direitinho nas aulas de direito constitucional que tive com ele. Pena que já não está conosco, porém suas lições ficaram para posteridade. Aprendi, depois de grande (como dizem os mais experientes), que o Estado não tem religião.

O legislador quis com isso proclamar a liberdade de crença, quis evitar que o nosso Estado se tornasse uma república baseada em princípios fundamentalistas, como acontece com vários países do oriente médio e nas Irlandas também; quis respeitar toda fé professada (seja ela qual for) e também afastar a religião das coisas públicas. Fez bem!

Acontece que há muito tempo a Constituição não tem sido alvo de respeito. Dizer hoje que o nosso Estado não tem religião é falácia. Basta ver nas escolas públicas: as aulas de ensino religioso transformam-se em aulas de uma só crença, que aqui não preciso citar. Ao fazer isso, direciona-se o aluno a apenas uma religião, desrespeita-se a lei de diretrizes e bases, a Constituição e, sobretudo, o próprio aluno. Tira direito que ele tem de conhecer as diversidades culturais religiosas do Brasil, de expandir sua capacidade de pensar outras religiões, de respeitar outras crenças e, mais que isso, conviver com a alteridade.

Contudo, a marca da religião não está só no ensino, basta ir a algum órgão público que serão encontradas imagens pregadas nas paredes. É assim na Câmara dos Deputados, no Senado Federal, nos Tribunais país a fora. Essas imagens, segundo a decisão da Juíza Maria Lúcia Lencastre Ursaia, da 3ª Vara Cível de São Paulo, não ferem os princípios da laicidade e da isonomia do Estado. Conforme disse a própria magistrada, “a laicidade não pode se expressar na eliminação dos símbolos religiosos, mas na tolerância aos mesmos”.

Concordo, deve haver tolerância sim. Mas como haverá a plena tolerância se nem todas as religiões admitem imagens? Há vários cidadãos ateus, esses não merecem respeito também? Ou todas ou nenhuma. Outra questão: será que a Excelentíssima Sra. Juíza toleraria uma imagem de um santo de uma religião afro-brasileira em seu gabinete? E se houvesse uma imagem de Maomé, ela penduraria ao lado do seu crucifixo? E Buda, e Shiva, e Jah e Vishnu...?

Haveria, sim, tolerância religiosa se nos departamentos públicos estivessem todas imagens sagradas do mundo, ou se num concurso público para Capelão, por exemplo, admitissem outras autoridades religiosas além de padres católicos e pastores protestantes. Dessa forma, a pergunta que não quer calar é: será mesmo que a Juíza respeitou mesmo um outro princípio constitucional, o da imparcialidade?

O Estado se torna laico, então, só para algumas religiões, porque “todas são iguais, mas umas são mais iguais que as outras”.

20 de ago. de 2009

Os Imortais das Academias de Letras

Outro dia, peguei-me imaginando caso fosse verídica esta estória de que escritor da ABL é imortal. E acabei pensando também alguns descabidos: já pensaram se um dia Deus, num desvario, desse realmente esse dom àqueles “mortais”? Lágrimas nos olhos.

Não que alguns escritores que estão lá não mereçam: Alfredo Bosi, grande estudioso da literatura brasileira; Carlos Heitor Cony, jornalista de primeira categoria; Ana Maria Machado, uma das mais importantes expoente da literatura infanto-juvenil; Ariano Suassuna, defensor ferrenho da cultura brasileira; João Ubaldo, autor de “A Casa dos Budas Ditosos”, e até mesmo os que já estiveram. Imaginem poder assistir a uma palestra em que estivessem reunidos Machado de Assis, Álvares de Azevedo, Aurélio Buarque de Holanda e... José Sarney? Isso! José Sarney, esse imortal da literatura brasileira, dos livros desconhecidos que não é lido por ninguém. Imaginem-no para posteridade como escritor e também como político? Senador para sempre, até a eternidade. Foi por isso que me peguei com as lágrimas nos olhos. Mas não só por ele: é que Fernando Collor, outro exímio escritor, fará parte da cadeiras dos “imortais”, e isso torna a situação insustentável. Nem Deus nem o Diabo fariam isso com o povo brasileiro. Tenho certeza.

Falo de Collor mais uma vez porque ele é candidato único a uma cadeira na Academia Alagoana de Letras (AAL). Essa candidatura una foi intermediada por um escritor daquela academia e ex-promotor de justiça daquela terra e conta com a adesão de todos os 40 imortais daquela casa. Como inaugurador das coisas impossíveis, o ex-presidente será chancelado “imortal” para AAL sem nenhuma obra publicada. Collor, o imortal, segundo informações, pretende lançar, futuramente, dois livros: um com os discursos dele na tribuna, que deve incluir, por exemplo, o “ingula-as e digira-as como quiser” ou “eu tenho aquilo roxo” (discurso no Ceará, em 1991), e outro livro falando de um suposto golpe que ele levou quando ainda era Presidente desta República.

Mas, então, por qual motivo o ex-promotor de justiça defende tanto uma cadeira para Collor mesmo sem o senador ter escrito nenhuma obra? É que, conforme justificativa do próprio promotor, Collor é dono de uma empresa de comunicação muito poderosa naquele estado: o jornal “Gazeta de Alagoas”. Percebe-se, então, que os critérios para uma cadeira nas academias de letras são outros.

Não acho ruim que transformem as Academias de Letras em APL’s – Academias Políticas, Marco Marciel também é um “imortal”. Essas academias deveriam aproveitar o oportunidade, já que os nossos políticos acadêmicos estão tomando de conta também daquela casa, e oferecer até mesmo um curso de formação para ser político, afinal de contas para quase todos os cargos públicos há uma “academia”, uma escola. Há a escola para ser magistrado, há a escola para ser promotor, há escola para ser diplomata, há escola para ser delegado, policial, há escola para ser professor, médico, professor, contador. Só não há escola para ser político, por quê?

Nada melhor que uma escola de formação de políticos. Lá eles aprenderiam lições relacionadas à ética, à constituição, ao direito administrativo. Passariam a saber que todo ato administrativo é publico, portanto deve ser publicado; entenderiam que o princípio da publicidade é constitucional, assim como a moralidade e a legalidade. Aprenderiam que não se mistura coisa pública com coisa privada.

14 de ago. de 2009

A briga entre o monopólio e a fé

O telejornalismo brasileiro anda em baixa. É que por quase todos os canais TV abertos que se queira assistir sempre há uma certa parcialidade na informação. Esta, direito do cidadão, quase nunca pode ser levada tão a sério pelos telespectadores, senão comete-se o risco de se julgar sem o pleno conhecimento de causa.

O embate é antigo: de um lado a Rede Record do líder Edmar Macedo, bispo e proprietário da Igreja Universal do Reino de Deus; do outro, a Rede Globo de Televisões, da família Marinha, dona do monopólio televisivo brasileiro há várias décadas, desde a ditadura, quando Roberto Marinho ganhou a concessão. Em jogo, o monopólio dos olhares e o monopólio da fé, em detrimento do bom jornalismo e da boa informação.

Atualmente, a denúncia que pesa sobre a cúpula da Igreja Universal é a de apropriação do dinheiro arrecadado em cultos para compra de imóveis, segundo relatório da Coaf – Conselho de Controle de Atividades Financeiras. O relatório foi anexado a outra denúncia do Ministério Público: o uso de doações de fiéis para abastecer empresas ligadas à Igreja. As supostas falcratuas estão sendo muito bem exploradas pelo Jornalismo Global, que, como urubu na carniça, se delicia ao ver a podridão do adversário e ocupa grande parte do Jornal da noite para abordar esses fatos, com veemência até.

Em contra-ataque, jornalismo da Record explora - além do envolvimento das Organizações Globo com aquisições indevidas do dinheiro público para Fundação Roberto Marinho e emissão de notas fiscais falsas - o passado obscuro da Rede Globo. Ontem, exibiu uma reportagem longa mostrando trechos de um documentário chamado “Além do Cidadão Kane”.

Conto: Cidadão Kane foi um longa-metragem de 1941, baseado na vida do magnata do jornalismo William Randolph Hearst. Conta a história de Charles Foster Kane, um menino pobre que acaba se tornando um dos homens mais ricos do mundo. Pois bem. O documentário faz uma comparação entre Kane e Roberto Marinho, que foi “além” daquele. Produzido pela Televisão Britânica em 1993, aborda a posição dominante da Globo na sociedade brasileira e, mais que isso, a influência que ela (ou ele, Roberto Marinho) exerce nas relações políticas do pais: há quem credite o fato de Fernando Collor ter sido eleito por causa da manipulação havida no último debate com o então adversário Lula, de forma que Collor pareceu ser mais “simpático” à massa (o resultado já é sabido). Tem entre outras personalidades nos relatos Chico Buarque e o antigo sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva - ainda sem a produção dos marketeiros.

Enquanto os dois canais de TV se digladiam, os telespectadores se transformam em reféns de informações meramente midiáticas e com o propósito apenas de desqualificar uma a outra. Não há outro o objetivo para as duas emissoras que não seja o “lucro”. A informação em si, que deveria ser objetivo principal da atividade jornalística, fica em segundo plano. O que está em jogo é, de um lado, a perpetuação de um monopólio da televisão brasileiro, o que gera um bom dividendo; e do outro, a exploração da fé com o fim de angariar vantagens pessoais, mesmo que isso prejudique de certa forma, fiéis. Esperemos sentados então, e com o controle remoto na mão, a próxima edição da novela “briga por dinheiro”.

13 de ago. de 2009

Imagens inéditas da chegada do homem à lua.


E eu, na minha santa ingenuidade, achava que a família era dona apenas de um estado brasileiro. Creio que seja mais um caso para ser investigado na Comissão Antiética do Senado. Falo isso porque tenho a plena certeza de que esses bens não são declarados à Receita Federal desde 1969.

12 de ago. de 2009

Mais humano do que ser!

Seres humanos: seres e humanos.
Seres que matam
Humanos que perdoam.
Talvez fosse mais fácil
Dizer todos os defeitos seus,
Que tanto me incomodam,
Mas eu não quero, eu não posso,

Eu quero te falar de todo sentimento
De quando me lembro
Dos nossos melhores momentos.

Mas entenda, isso não é um amor de declaração,
Muito menos um pedido de redenção.
Amanha só serão, como se chama mesmo?
Ah! lembranças.

Mas hoje eu só quero recordar
Sem me lamentar
Vou acordar sem pressa,
Ver o sol iluminar minha janela
Ligar a TV e ver a reprisse
Daquela velha novela.

E deixarei de lado o "ser"
Eu quero ser humano .


Por Carol de Lima

Coração de Pedra

SEDIMENTAÇÃO
LAVA
INÓCUO, DURO, ESTÉTICO
OPACO,
CINZA,
PESADO
CHUMBO
MAGMA ARTERIAL

ABRASO, MAS
FRIO
FRIALIDADES
BATO, TOCO, FAÇO VIVER

VIVER DEPENDE DE
MIM
E DE MIM FAZ-SE NECESSÁRIO CUIDAR
CUIDAR BEM, CUIDAR TODO,
TUDO.

MAS, MESMO ASSIM, SOU PEDRA
DURA, INQUEBRÁVEL,
DENSA.

NÃO TENHO DONO
NADA ME DOMA
NÃO TENHO
ALMA

CORAÇÃO QUE SOU
SENTIMENTOS NÃO
DOU.



E NEM PODERIA SER DIFERENTE.


10 de ago. de 2009

Como nossos pais.

Não sei quando aprendi a gostar de política, creio que tenha sido nos embates que presenciei aqui, na Capital, por volta de 1994. Primeiro ano em que eu votara, facultativamente. Naquela época, o povo, sedento por mudanças, elegeu o agora Senador Cristovam Buarque para Governador.

Lembro de meus pais, dos meus vizinhos discutirem política. Lembro do jogo baixo: algo normal, afinal de contas, segundo os próprios políticos, “os fins justificam os meios”. Aprendi, estudei-a, gostei de tentar desvendar as jogatinas, as maracutaias, os conluios.

Mas o fato é que outro dia vinha dentro do metrô eu e milhares de pessoas, inclusive quatro jovens que se propuseram debater política, até que um deles falou algo interessante: “não gosto de política e nem de políticos”. Exímio curioso da conversa alheia, comecei a prestar atenção no papo. Não saiu muita coisa. Mas a frase dita (“não gosto de política”) matutava minha cabeça, “na parede da lembrança, esse é o quadro que me dói mais”.

Fico pensando: o que nos faz não gostar de política? Por natureza, somos seres políticos. Para tudo, fazemos políticas, desde criança. Há política na hora de pedir balinha aos pais, na hora de indagar o porquê de não levar palmadas, não hora de pedir pra ir à balada, na hora de defender aqueles que gostamos. Na hora de defender a nossa religião, por exemplo: Jesus morreu por causa da política. Política é mais velha que nós.

Até entendo aqueles jovens, a classe política deste país não é, há muito tempo, motivo de orgulho. Os escândalos se sucedem um atrás do outro ano a ano. E é como merda no ventilador, no final todos se sujam: um corrupto nunca está maquinando só, sempre há mais corruptos na história. Isso tira-lhes as esperanças.

Mas, mesmo assim, escândalos não são motivos para abandonarmos a política. A política está acima dos políticos. Política é como nossa casa: se não a comandamos, se não damos direção a ela, se a deixamos de lado, há quem faça tudo isso à sua maneira. É o que ocorre, por exemplo, nas duas Casas Legislativas mais importantes do país: Câmara e Senado federais.

Abandonamos nossa política. Não é por acaso que os Renan’s, os Collor’s, os Sarney’s da vida reelegem-se há anos, não procuramos reformar, inovar. Eles comandam a casa. Mas, ainda assim, quando os escândalos aparecem, ficamos indignados. Por que ficamos indignados? Não será a hora de parar de votarmos “como nossos pais” e deixar de lado “nossos ídolos que ainda são os mesmos”?

Mas, só oxigenar a casa ainda não basta. Faz-se necessário cobrar do inquilino dela (isso! inquilino, porque o dono somos nós, os cidadãos) para que ele cuide da casa com dignidade, respeito e, sobretudo, com ética. Aproveitemos, então, a oportunidade e mudemos, portanto, os nossos inquilinos e, além disso, passemos a cuidar mais do nosso lar.

7 de ago. de 2009

No ônibus

Sangue nas unhas de uma, cabelos nas mãos das outras. Algumas pessoas apaziguando a situação, outras com o sorriso estampado na cara, adorando a situação...afinal de contas não é todos os dias que se presencia um espetáculo como este:
- Piranha! dizia a que estava sentada.
- Vagabunda! dizia a descabelada que estava em pé.
- Vá dormir em casa, ônibus não é lugar de dormir!
- O ônibus não é teu, vá mandar na sua casa!
- Vá se...!
- Vá você...
- Vão as duas! Afirmavam os que estavam no fundo.
- Gente, que absurdo! Diziam os mais sensatos.
- Vou parar o ônibus – dizia o motorista, já parando-o – se não pararem a briga agora.
- Pai nosso que estai no céu. Santificado seja o vosso nome...
Cristãos começaram a rezar. Nem preciso falar que as concordâncias verbais e nominais não foram respeitadas. Por questão estilística, resolvi modificar algumas palavras, sem perder de vista a verossimilhança do fato, que é cômico se não fosse absurdo, como todo tipo de agressão física, seja por um simples toque entre pessoas, seja por petróleo, por exemplo.
Já que tratei da física, devo informar-vos que ela foi a culpada, não totalmente, mas parcialmente. A outra parte da culpa fica por conta dos caprichos humanísticos. A que estava em pé (que aqui graciá-la-ei de Gumercinda) resolveu colocar a mão no banco do ônibus para não ser surpreendida pela inércia. A que estava sentada (Araci) caiu no sono, encostou a cabeça no mesmo lugar onde estava a mão da Gumercinda... Culpa da física, já que a força gravitacional puxa a nossa cabeça para baixo, quando estamos dormindo, e como dois corpos não ocupam o mesmo lugar, tocaram-se.
Esse simples toque entre pessoa resultou no fato contado lá em cima. De início, só mais uma discussão, simples palavreados, debate acalorado:
- Eu quero dormir! Qual problema?... Exclamava Gumercinda.
- Quer dormir? Então vá para casa!!! Respondia Araci.
- Minha filha, o ônibus não é teu! Quer se segurar? Coloque a mão em outro lugar...
- Então beleza, sendo assim... Respondeu Gumercinda, então, colocou a mão na cara da Araci, que se levantou e revidou, puxando os cabelos da agressora. Levou uma unhada. Caíram no assoalho do ônibus, que cotidianamente anda lotado. Pessoas se comprimindo entre bancos e catraca. Confusão, correria, bagunça, gritaria, risadas...
Uma, impávida que nem Muhammed Ali; a outra, tranqüila e infalível como Bruce Lee. Os usuários loucos, como nas antigas arenas em Roma, esperando o desfecho de uma boa briga entre mulheres: quando uma não sai pelada, sai descabelada. Eu, eu... eu estava ali, indiferente, onisciente, interiorizando todas as informações (ou pelo menos tentando) para depois externá-las em forma de palavras.
Acabada a discussão, da forma como descrevi no primeiro período, continuei a ler o livro que estava na minha mão e a matutar a aula de sábado. Vida de professor.
Ouvem-se cochichos, risadas, as duas sem graça. Deviam estar pensando o quanto banal foi o motivo das agressões mútuas ou o tanto que as pessoas ao mesmo tempo em que estão tão juntas se sentem separadas. E mesmo num “espaço curto, quase um curral”, elas não podem se tocar. Tudo voltou ao normal. Assim começou mais um dia.
Por Flávio Rossi

6 de ago. de 2009

Jeitinho Brasileiro?


Semana passada fui ao cinema, fui levar minha filha para assistir a um desenho animado. Desses que procuram estrear justamente nas férias das crianças: isso as instiga.
O fato é que sempre antes da sessão iniciar, há aquele coquetel de lanche que temos de fazer. E o preferido da criançada em geral é o de uma empresa internacional, líder no segmento de alimentação.
Comprei o lanche. Custou-me cerca de 13 reais. Mas o que mais me intrigou foi o jeitinho que a empresa estrangeira deu para tentar ludibriar-nos a nós, brasileiros: ao pedir o produto, o cliente recebe o hambúrguer, a batata e o refrigerante. O problema está no refrigerante.
Vamos o causo: o refrigerante da lanchonete custa cerca de R$ 4,00 reais, em média. Ao comprar um copo de 500ml, o cliente recebe justamente a metade do produto, a outra é gelo. Fazendo uma rápida comparação, acaba-se percebendo que um refrigerante com 2litros, em qualquer rede supermercado, custa em média R$ 3,00 reais. A malandragem: pague R$ 4,00 reais por 500 ml de refrigerante e leve apenas 250ml.

E isso acontece em vários outros ramos, por exemplo, no bancário, no da telefonia. Em qual outro país do mundo cobra-se por não utilizar o telefone? Só no Brasil, esse “Impávido Colosso!” Isso mesmo, ao contratar o serviço telefônico de uma dessas empresas de capital estrangeiro, o cliente – mesmo sem utilizar o telefone para fazer qualquer tipo de ligação – paga por uma taxa, uma tal de assinatura básica: R$ 40,00. Não é por acaso que várias empresas estrangeiras estão investindo em telefonia aqui, no Brasil, afinal de contas o retorno gera preciosos dividendos: pague mesmo sem usar!

Ao colocar gasolina e ao pagar por ela, o cliente recebe um adicional: o ar. Outro dia até tentaram instalar nos postos de gasolina (a maioria aqui no Brasil é estrangeiro) um dispositivo que evitaria a passagem do adicional pela bomba de gasolina. Nada mais justo, se pago 5 litros - por exemplo - de gasolina, gostaria muito de receber os exatos 5 litros. Um lobe dos xeiques dos combustíveis acabou com "a felicidade geral da nação" e o tal dispositivo passou longe da bombas. Esse mesmo ar é pago nas contas de água. Ar é algo que tem de sobra aqui no Brasil. Cheguei a achar até, em algum momento, que ele era gratuito, mas... nada de graça!
Não vou divagar aqui falando de empresas de vários outros ramos, fosse assim eu até perguntaria por que a crise mundial passou longe dos bancos no Brasil. Por que não houve “quebradeiras” por aqui, assim como houve em vários outros países. Não, não vou perguntar isso. O fato é que importamos um produto muito criticado por alguns especialistas brasileiros (sociólogos, antropólogos...). Importamos um produto nosso, um produto autêntico, um produto nacional: o nosso “jeitinho”.

5 de ago. de 2009

Direito Autoral: Entre o interesse público e o privado.

Em dias nos quais a realidade técnica está ligada diretamente à produção material (e por que não dizer capital), o debate que se estabelece de maneira desigual faz lembrar o eterno desequilíbrio entre o forte e o fraco. A lógica de mercado que transformou cultura e saber em produto se estende à percepção social, causando deformações de diversos graus, onde, grosso modo, imperam os interesses privados aos públicos, delimitando alcances e benefícios técnicos a uma pequena parcela da humanidade.


O monopólio da técnica, do conhecimento, da arte e cultura, sempre dividiu em castas a sociedade humana. O controle técnico e científico infelizmente ainda não conseguiu inserir o ético que se torna fluído e tênue ao decorrer da construção histórica de um sistema que privilegia uma minoria de pretensos senhores do saber, dividindo a sociedade basicamente em pobres e ricos, em possuidores e despossuídos ou consumidores e não consumidores.


“O isolamento fundamenta a técnica; reciprocamente o processo técnico isola”, esta frase atribuída a Guy Debord em “A Sociedade do espetáculo”, bem poderia resumir em aforismo a realidade das políticas e legislações de patentes vigentes atualmente. Ao se patentear hoje, pela lei, pretende-se a garantia de uma exploração econômica monopolizando o processo de inovação daí decorrente, com vistas à criação de uma mercadoria, produto a ser capitalizado em detrimento de um horizonte de possibilidades que poderiam ser alcançadas através da contribuição ou soma de esforços e iniciativas variadas, dentro do corpo social. Assim o pretenso direito legítimo a exclusividade gera a exclusão, ou apartação de um sem número de possibilidades, que poderiam ser alcançadas se a lei contemplasse o bem maior, social, em detrimento de interesses financeiros, comerciais ou individuais. Segundo Theodor Adorno, o meio no qual a técnica atinge tamanho poder perante a sociedade, faz da técnica uma encarnação do poder dos economicamente mais fortes sobre o restante do corpo social, ou seja, “A racionalidade técnica hoje é a racionalidade da própria dominação”.


Exemplo claro de quão acirrado pode ser o debate sobre direitos autorais, podemos citar o caso em que se viu envolvido o Governo brasileiro, quando do ano de 2001 o então Ministro da Saúde José Serra determinou a quebra da patente de medicamentos destinados ao tratamento de doentes de AIDS. A imprensa mundial por diversas se colocou em defesa dos grandes laboratórios e contra a atitude do então ministro, e principalmente contra o efeito cascata que daí poderia decorrer. Fato interessante que ilustra a natureza do debate onde, neste ato de governo, segundo Cristovam Buarque, “a ética foi colocada acima dos interesses e das leis comerciais”.
Infelizmente em outros setores o Brasil tende a tomar iniciativas que contradizem o bom senso e a realidade atual. A extensão do prazo de proteção dos direitos autorais para 70 anos após a morte do suposto autor é exemplo negativo de como vaidades e interesses individuais podem privar por gerações o espaço público do aproveitamento de nosso capital cultural e somar iniciativas em prol da construção de um novo saber.

Pierre Lévy em “A inteligência coletiva” repensando os mecanismos de construção cultural anseia justamente o contrário da iniciativa jurídica brasileira. Para este autor, a velocidade e as maravilhas alcançadas pelo meio técnico deveriam suscitar há uma construção mais democrática do que este chama de “saber coletivo”, fazendo retroceder a linha da individualidade de autoria para uma relação de co-autoria com o coletivo, com a sociedade, de modo a alcançar maior democracia na produção e distribuição cultural-técnico-científica.


Está claro, a velocidade do mundo globalizado rompe barreiras não naturais criadas e legitimadas em leis que não contemplam a realidade e principalmente as necessidades sociais. A lei de patentes hoje estimula mais que previne a pirataria, causando deformações tais quais as patentes tidas como legítimas firmadas sobre a criminosa prática da biopirataria, da qual o Brasil é constante vítima.

Este debate propicia a tentativa de encontrar meios de equilibrar as necessidades técnicas e o bem estar público. Talvez resida em uma nova perspectiva o caminho para uma flexibilização dos direitos autorais, que já parecem estagnados ou fadados a se tornarem letra morta por não se condicionarem ao interesse público e por não disporem de um poder de controle ou fiscalização eficiente, que garanta defesa mínima ao meio técnico para se recriar. As leis devem ser reflexo dos anseios da sociedade. O aumento ou diminuição de prazos de proteção devem ser vistos de maneira pragmática de modo a atender as necessidades particulares de cada país, região ou povo, respeitando o estágio histórico em que cada um se encontra, e não legitimar laços de dominação econômica ou de neo-colonialismo científico-cultural. O debate público ou a participação popular deve prevalecer na construção de uma nova relação entre produção de conhecimento, criação cultural e, principalmente, difusão dos possíveis benefícios destes.


Com maior participação democrática em âmbito global, na construção de saberes e troca de conhecimento e experiências, talvez possamos substituir o atual modelo protecionista, que prioriza a marca, os conglomerados, o capital ou a individualidade por uma mais saudável relação social, mais igualitária, democrática e na qual as leis possam enfim contemplar o interesse público e privilegiar o ético sobre o econômico.Por Alexandre de Medeiros.

Liberdade - Carlos Marighela






Não ficarei tão só no campo da arte,

e, ânimo firme, sobranceiro e forte,

tudo farei por ti para exaltar-te,

serenamente, alheio à própria sorte.


Para que eu possa um dia contemplar-te

dominadora, em férvido transporte,

direi que és bela e pura em toda parte,

por maior risco em que essa audácia importe.


Queira-te eu tanto, e de tal modo em suma,

que não exista força humana alguma

que esta paixão embriagadora dome.


E que eu por ti, se torturado for,

possa feliz, indiferente à dor,

morrer sorrindo a murmurar teu nome.





Liberdade.

Às vezes, fico imaginando o porquê de François-Marie Arouet, proeminente filósofo francês, à frente de seu tempo, ter pronunciado as seguintes palavras: “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las”. E fico imaginando também o porquê de George Orwell, autor de “A Revolução dos Bichos”, ter usado as mesmas palavras de Voltaire em um dos seus artigos acerca do direito de expressão.



Certamente, os dois pensadores percebiam que essa liberdade estava correndo sério risco. Intrigante é saber qual tipo de pensamento que eles teriam se soubesse que uma família de políticos brasileiros, que ajudou na luta pelos direitos de expressão, que um deles faz parte da ABL – Academia Brasileira de Letras -, que um deles é Presidente do Senado Federal, instituição fundamental à democracia, passou por cima do direito que ele mesmo ajudou a estabelecer. Certamente eles falariam: “só no Brasil mesmo!”. E o que eles diriam se soubesse que o tal político se utilizou de um amigo da família, um Desembargador do DF, para conseguir uma liminar a fim de impedir um jornal de publicar matérias a respeito do mais recente escândalo no Senado? A uma hora dessas, eles devem estar se revirando no caixão.


O fato é que tentativa da família Sarney de impedir o jornal “O Estadão” de publicar matérias de interesse público, afinal de contas o Senador é um homem público, ajudou ainda mais na condenação de Sarney, o tiro saiu pela culatra. Atentado à liberdade de expressão como esse só foi visto em plena ditadura.


O que é repugnante também é saber que interesses individuais, nesses país, por vezes se sobrepõem aos interesses coletivos. É o tal do misturar o público com o privado, fazendo do Estado o quintal de casa. Penso que o desembargador deveria, no mínimo, se declarar impedido de julgar tal liminar.


As palavras, por mais que não concordemos com elas, têm de ser ditas. É um direito constitucional dizê-las. Não por acaso estou escrevendo-as aqui, foi um direito conquistado por meio de muitas batalhas, lutas, vidas: Carlos Marighela, Carlos Lamarca, Frei Tito, Zuzu Angel, Vladimir Erzog... Aliás, um dos poemas contemporâneos mais belos leva o nome de “Liberdade”, Marighela é o autor: “É que eu por ti, se torturado for, possa feliz, indiferente à dor, morrer sorrindo a murmurar teu nome”.


Mal sabe a família Sarney que o feitiço pode virar contra o feiticeiro (como virou), e que eles podem ser os próximos a ser calados. Se a moda pega... Por Flávio Rossi

O que 20 anos de política não fazem!

Galera, para os que não entenderam o que eu quis dizer no artigo abaixo, quando afirmei que o mesmo Sarney que o Collor defende hoje não era o mesmo Sarney em que ele meteu o pau em 1989, para os que não entenderam, disponibilizo o vídeo abaixo.
Maquiavel, outro dia escreveu isto: "o tempo lança à frente todas as coisas e pode transformar o bem em mal e o mal em bem". Agora, entendo o porquê.
A dissimulação, nesse jogo sujo que se chama política, é algo que ultrapassa qualquer barreira da racionalidade. Política não é pra se compreendida, definitivamente. O link está aí abaixo.

4 de ago. de 2009

Os olhos de Raio de X adicionado a um bom DNA.

O Senado parou. Não se vota mais matérias importantes para coletividade. O que se vê é uma guerra, batalha política que teve apenas um singelo “bem-vindo” ontem, na volta do recesso parlamentar. De um lado Pedro Simon – velho e respeitado Senador – e do outro, Collor e Renan – velhos e... Senadores, para fechar.


Tudo começou quando Simon começou a defender a saída de outro velho e...Senador, José Sarney, Ex-Presidente da República, acusado de desvio de verbas (desvio de verbas é o termo usado à classe mais avantajada, que se preocupa em usurpar valores acima dos milhões. Para os menos endinheirados, o nome que se dá, no popular, é “roubar”), voltando... acusado de desvio de verbas, de tráfico de influência, de nepotismo e etc. Ao pedir a saída do Presidente da Casa, Renan achou-se no dever de defender o velho amigo e companheiro de tantas batalhas, praticamente chamou Simon de traidor, uma vez que este declarou, outrora, apoio ao Presidente, mas que – naquele momento – pedia para Sarney deixar o cargo. O mesmo Renan – dono do Senado – esteve na berlinda há pouco tempo. Simon, então, retrucou-o falando no púlpito que ele tinha feito a mesma coisa com o Senador Collor, declarou apoio ao então Presidente da República e, ao ver que a coisa tava feia, abandonou-o. Collor, que hoje defende Sarney (o mesmo Sarney que ele atacou em 1989), achou ruim seu nome ser falado (collado numa suposta jogatina para o rumo da China) da tribuna. E com palavras chulas e uma retórica de Jagunço pediu para que Simon “engolisse e digerisse” como quisesse as palavras que ele iria falar. Mal se lembra o Senador o prejuízo que milhares de brasileiros tiveram de “engolir e digerir” quando ele resolveu confiscar a poupança dos correntistas.


O que mais me impressionou não foi o bate-boca, mas os olhos de Collor: vermelhos, esbugalhados, arregalados, estupefados, lembrei-me dos X-Men. Se ele fosse um mutante, certamente seria o Ciclope . Dedos eretos como se tivesse uma arma na mão, fungava feito um búfalo. Coisas do DNA.

Para os que não sabem de onde vem toda aquela “vontade de matar” de Collor de Melo, agora esclareço: filho de Arnon Afonso de Farias Melo, empresário, ex-governador de Alagoas e ex- Senador da República, Arnon (quando também era Senador) assassinou com três tiros, dentro do Senado Federal, um adversário político, O Senador José Kairala. Arnon, pai de Collor, foi, então, o primeiro Senador da República a ter o mandato cassado. Coisas do DNA.
Por Flávio Rossi

Flávio Rossi

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Posso não concordar com suas palavras, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las - Voltaire