Ultimamente, ando sem inspiração para escrever. E foi nesse contexto que eu peguei um livro de poesia completa do mais genial dos poetas, segundo minha concepção: Carlos Drummond de Andrade. Resolvi, então, não ir ao índice remissivo da obra, abri-o aleatóriamente, como quem procura uma palavra do dia na Bíblia, no Corão, no Sutra. Fi-lo. O livro é grosso, as páginas são de papel bem fino, mas - mesmo assim - tive a sorte de ler no dia a poesia a seguir.
Quero
(Carlos Drummond de Adnrade)
Quero que todos os dias do ano
todos os dias da vidade meia em meia hora
de 5 em 5 minutos
me digas: Eu te amo.
Ouvindo-te dizer: Eu te amo,
creio, no momento, que sou amado.
No momento anterior
e no seguinte,
como sabê-lo?
Quero que me repitas até a exaustão
que me amas que me amas que me amas.
Do contrário evapora-se a amação
Pois ao não dizer: Eu te amo,
desmentes
Apagas
teu amor por mim.
Exijo de ti o perene comunicado.
Não exijo senão isto,
isto sempre, isto cada vez mais.
Quero ser amado por e em tua palavra
nem sei de outra maneira a não ser esta
de reconhecer o dom amoroso,
a perfeita maneira de saber-se amado:
amor na raiz da palavra
e na sua emissão,
amor
saltando da língua nacional,
amor
feito som
vibração espacial.
No momento em que não me dizes:
Eu te amo,
inexoravelmente sei
que deixaste de amar-me,
que nunca me amastes antes.
Se não me disseres urgente repetido
Eu te amoamoamoamoamo,
verdade fulminante que acabas de desentranhar,
eu me precipito no caos,
essa coleção de objetos de não-amor.